Carmem
Verônica: "Hospitais, escolas,
tudo isso tinha que ser aos moldes da Fifa, porque a Fifa dita regras
aqui”
Atriz
da Rede Globo fala do trabalho na novela "Sangue Bom" e da emoção de participar de um filme que foi premiado
doze vezes. Além disso, ela se diz favorável às manifestações e critica a presidente Dilma Rousseff (PT)
Marcos
Bulques
Rio
de Janeiro
O
dia não estava nem quente, nem frio. A temperatura estava agradável.
Chego em um prédio no Leblon, bairro
da Zona Sul do Rio de Janeiro. Pelo porteiro, minha presença é
anunciada. Vou pelo elevador. No oitavo andar sou recebido pelo
Shing, um pequinês preto que fez as honras da casa. De repente,
muito chique, bem penteada e maquiada surge Carmem Verônica, atriz
que faz sucesso na televisão brasileira que neste mês completou 80
anos. Ela está atualmente no ar na Rede Globo como “Carmita“ na
novela “Sangue Bom”. Para ela, foi um grande presente interpretar
essa personagem. “Foi uma surpresa muito agradável, antes mesmo de
começar a gravar Sangue Bom. Me telefonaram dizendo que tinha um
papel que era minha cara, não sei se é porque a personagem é uma
velha ou eu estou velha mesmo (risos). Logicamente é um papel
humorístico, é uma senhora hilária, já casou 17 vezes e gosta de
garotão, então no contexto da novela esse é um núcleo de humor,
sendo que o outro núcleo de humor está com a Marisa Orth, que é
excelente atriz e eu amo de paixão. A novela é muito de jovens,
então pessoas com mais de 15 anos, digamos (entre risos), estamos eu
e Ioná Magalhães. Estou muito contente”, conta.
Carmem Verônica em seu apartamento no Leblon. Ao fundo, uma foto ousada do início da carreira.
A
comédia sempre esteve presente na vida da atriz que normalmente tira
um sorriso e leva a alegria para o público. Recentemente Carmem
Verônica fez um filme ao lado de Marcos Palmeira e Nathalia
Timberg chamado “Vendo ou Alugo”, que levou 12 prêmios na 17ª
edição do Cine PE, Festival do Audiovisual, em Olinda, PE. “O
filme é muito engraçado, onde tem uma ex-embaixatriz, que é viúva
e tinha uma mansão. Então gravamos numa casa bem antiga no bairro
do Leme, aqui no Rio, onde viviam como se fosse uma comunidade, em um
morro que com o tempo se tornou uma favela em volta e a
ex-embaixatriz continuou ali, devendo impostos e não pagava. O
advogado cobrando, cobrando e a ex-embaixatriz vivendo como se nada
tivesse acontecendo. O negócio dela era fazer ginástica na praia em
frente ao Copacabana Palace e jogar com três amigas dela, que eram
chamadas de tartarugas, que são as atrizes Dayse Lúcidi, Ilka
Soares e eu. Mas acho que todos tem um papel importante porque o
elenco não é grande , é meio compacto, porém excelente”,
explica.
A atriz em seu apartamento no Leblon, Rio de Janeiro. Detalhe: O quadro com seu rosto pintado a mão.
Entre
risos, da ficção passamos para a realidade. A atriz deu sua opinião
diante do caos que vivemos frente as manifestações que levou a
população para as ruas de inúmeras cidades pelo país. “Os 0,20
centavos foi a gota para o povo explodir e dizer que não aguenta
mais. Particularmente eu acho o brasileiro muito acomodado. Só que
foi indo, foi indo e explodiu. A gente paga imposto e não temos
ônibus suficiente nem qualidade de condução suficiente. A sua
presidenta, a minha, a nossa e infelizmente a do Brasil, disse que
vai fazer um trem-bala, mas não tem nem aquele trem que íamos para
São Paulo, o corujão, que o Vinícius (de Moraes) chamava de
corujão ou o trem dos covardes, para quem tinha medo de viajar de
avião. Eu ia muito quando fazia programa em São Paulo. Não tem nem
esse. Realmente eu não acredito em nada que fazem aqui, porque o
dinheiro é tão alto nessas comissões. Ao invés de fazer um prédio
decente, eles fazem um prédio que antes de inaugurar ele já caiu,
porque ao invés de cimento botam areia. Então eu não posso
acreditar nesse país, que
Na sala de seu apartamento no famoso bairro do Leblon
tem político pegando avião com a família
para ver o jogo (O presidente da Câmara dos Deputados Henrique
Eduardo Alves (PMDB-RN), admitiu que foi de Natal ao Rio de Janeiro
em voo da FAB e levou parentes e amigos para assistir o final da Copa
das Confederações) mas você paga a passagem aérea, eu pago, o
brasileiro paga, você contribui para ter rua sem buraco. Eu, por
exemplo, não conheço rodovia aqui no Brasil. Eu conheço nos
Estados Unidos, na Europa, em muitos lugares do mundo que eu já fui
eu conheço rodovia. Aqui temos uma rua, nem avenida é. E é uma
merda, no bom português. E tudo isso porque estão nos roubando. Por
isso eu sou a favor das manifestações. Lógico que há baderneiros,
mas as próprias pessoas que fazem as passeatas se indignaram. Eu
estou plenamente de acordo, espero que não esmoreçam, porque agora
todos começaram a correr para fazer as coisas, mas como não há
dinheiro para isso, quem vai acabar pagando as contas como sempre
somos nós. Se fossemos pagar uma coisa que haveria um retorno bom,
até estaria de acordo”, disse.
A
atriz mostra-se revoltada com os gastos para a Copa de 2014.
“Hospitais, escolas, tudo isso tinha que ser aos moldes da Fifa,
porque a Fifa dita regras aqui. Tinha que fazer estádio lá no
Amazonas? Para os índios fazerem ocas depois lá dentro? Claro que
estão ganhando uma nota por cima disso. Eu acho tudo válido, desde
que você reivindique para o bem geral. Agora, pedir médicos de
fora? Pois que aumentem os salários dos médicos daqui. Veja o
professor, ganhar uma merreca e estudando o que o professor estuda,
dando aulas em vinte escolas para poder ter um mês decente. Que
merda é essa? Mas tudo bem, eu estou com Deus, esperando que, como
diziam, que esse seria o país do futuro, eu espero ter mais anos de
vida para ver um futuro melhor”, conclui.
Carmem Verônica durante entrevista
Carmem Verônica durante entrevista