Flavia
Flores sobre o câncer: “Os
meus amigos sumiram. Quando eu fui diagnosticada, os dez dias que eu
chorei, ninguém me ligou”
Ex-modelo e autora do
livro “Quimioterapia e Beleza” conta em entrevista exclusiva para
a coluna Inside desde o momento que foi diagnosticada com câncer de
mama até o trabalho que resultou na criação de uma página na
internet e que posteriormente viraria um livro
Capa do livro que teve lançamento com sucesso em várias capitais do Brasil
Depois do lançamento do livro,
marcamos por telefone nosso encontro, que por sinal, foi num café
próximo à avenida Paulista. De lenço na cabeça, mais por um
charme, porque o cabelo já tinha crescido novamente, estava Flavia
Flores, sentada, mexendo na internet pelo seu celular. É que ela
posta diariamente em sua página do Facebook comentários,
agradecimentos e tira dúvidas de seus seguidores. Sim, ela tem cerca
de 45 mil seguidores com cerca de 1 milhão de acessos ao mês. Tudo
isso porque Flavia, ao ser diagnosticada com câncer de mama em
dezembro de 2012, resolveu escrever sobre o assunto nas redes
sociais. Deu tão certo que a vida após o câncer foi relatada em um
livro. “Quimioterapia e Beleza” foi lançado recentemente com
sucesso em São Paulo, Rio de Janeiro e outras capitais e traz o
encorajamento para quem é diagnosticado com a doença, se sentir
mais forte e lutar de cabeça erguida e feliz pela vida.
Flavia dá dicas de como usar perucas e lenços.
O
lançamento do seu livro foi um sucesso. Você esperava ter o retorno
que teve?
Eu não esperava. Mas eu sabia que eu
iriam encontrar várias seguidoras, porque meu público é bem
diferenciado, são pacientes oncológicos, a família, os amigos,
então recebi muito carinho dessas pessoas.
Quando
você descobriu a doença, em algum momento pensou que ia morrer? O
que trouxe tanta garra para lutar?
Eu descobri a doença em outubro de
2012 depois de uma biopsia, em novembro eu retirei as duas mamas e em
dezembro eu comecei a minha quimioterapia. O pior momento de todo
esse processo foi o dia do diagnóstico. Nesse dia é horrível, você
não sabe se vai morrer, se vai viver, é uma incógnita. O que vai
ser de mim? E o meu filho? E minhas senhas da internet? São muitas
coisas que passam pela cabeça, o mundo vai me perder. E ai, o que
vai acontecer? Então, depois de dez dias de choradeira, eu resolvi
procurar na internet quais eram os artifícios de beleza que eu iria
usar durante o tratamento. Como colocar uma peruca, como lavar, como
colocar cílios postiços, como pintar sobrancelhas.
As
mulheres são muito vaidosas. Então como é esse processo de perda
de cabelo, ainda mais para você que trabalhou com moda?
Eu achava que era só as mulheres mas
os homens também sofrem bastante. Eu na real já estava mais
resolvida quando o cabelo caiu. Eu já tinha começado a página ( na
internet), já tinha poucos seguidores, mas já tinha.
Você
deve ser muito abordada por causa do assunto. Como recebe essas
pessoas?
Tenho toda paciência do mundo, adoro
ouvir a história delas, até por isso que demorou tanto a minha fila
(para autógrafos no livro) no Conjunto Nacional (São Paulo) porque
cada um quer contar um pouquinho da sua história e ninguém conta em
cinco minutos...Querem escutar uma palavra bonita, querem uma
dedicatória, querem um abraço, um beijo, então isso demora mais do
que cinco minutos, então por isso que a fila demorou tanto. Mas eu
sou muito atenciosa, não deixo de responder nenhuma pergunta e o
maior medo, pânico de uma mulher que é diagnosticada com câncer é
a perda do cabelo. Isso é unânime!
O
que uma pessoa deve fazer na hora que recebe o diagnóstico? Qual a
providência de primeiro momento?
Procurar a família, os amigos, não
ficar sozinha, conversar bastante. Eu conversei com cada um da minha
família, minha mãe, meu pai, meu filho, minha avó, ou seja, um por
um. Então a melhor coisa foi ter a minha família do meu lado. Os
meus amigos sumiram. Quando eu fui diagnosticada, os dez dias que eu
chorei, ninguém me ligou. Eu achava estranho e queria entender o
porquê que as pessoas não me ligavam. Entrei em contato com uma
amiga muito próxima e perguntei porque ela tinha se afastado e ela
me disse que sabia o que estava acontecendo comigo mas não tinha
palavras para me dizer, então eu entendi o quanto é difícil até
para os amigos. Então eu fiz uma página no Facebook para trazer
meus amigos de volta, para eles não pensarem que eu vou bater neles
se eles aparecerem aqui. É natural que as pessoas pensem que vamos
ficar agressivos. Fiz a página “Quimioterapia e Beleza” para
servir de canal de comunicação com meus amigos. Então eu postava
uma receita que eu aprendi fazer, postava uma foto de um lenço que
eu ganhei, eu agradecia. Assim, as pessoa viam e curtiam e percebiam
que eu estava feliz, sempre sorrindo, bem.
E
você estava mesmo?
Sim, eu tinha aceitado a doença. Eu
acho que hobby é incrível para uma pessoa que está passando pelo
tratamento. O meu hobby foi escrever, mas tem gente que gosta de
dançar, cantar, cozinhar, fotografar. Tem gente que nunca foi
fotógrafo, mas tem uma vontade de fotografar, então aproveita esse
olhar novo que a pessoa terá da vida depois de um diagnóstico
desse, porque sua vida parece que acabou. Mas é um marco, antes do
câncer e depois do câncer na vida de qualquer um que passa por
isso.
O processo da quimioterapia
Como
foi escrever esse livro?
Olha, é um livro que é um presente
para uma pessoa que foi diagnosticada. É um manual do dia a dia para
qualquer um. É difícil? É, mas não é impossível passar pelo
tratamento.
E
como está sua saúde hoje? O tratamento continua?
Sim, eu estou fazendo quimioterapia
desde dezembro de 2012 e vou até maio de 2014, a cada 21 dias. A
radioterapia já está finalizada, mas ainda tenho a quimioterapia e
também vou tomar um remédio até 2023. São dez anos de remédio. É
isso, é de praxe, não tenho escapatória, mas ainda bem que tem o
tratamento.
O lançamento do livro em São Paulo
Qual
a maior lição que você tirou de toda essa sua experiência?
Que a vaidade, a autoestima ajuda
muito a mulher a passar por essa fase. A mulher tem que se arrumar
para sair, tem que se produzir, porque senão a gente assunta as
pessoas nas ruas, assusta mesmo. A gente precisa consumir moda, ir
comprar o sapato, é bom. Se ficar com cara de vítima, vai assustar
o namorado, a família, vai todo mundo querer sair de perto. Agora se
ficar em alto astral, os amigos voltam, vão te dar força. Dá para
ficar bonita durante o tratamento. O câncer se não mata, embeleza.
A gente fica mais bonita, mais interessante, aliás, eu me acho!
Flavia durante entrevista para Marcos Bulques